Ricardo Cifu, vice-presidente da GEF Capital Partners para a América Latina, lidera um dos principais fundos de private equity focados em soluções climáticas.
Com um histórico que remonta à década de 90, quando a GEF iniciou suas operações em Washington (EUA), o fundo foi um dos pioneiros em investimentos voltados para o combate às mudanças climáticas. Desde então, expandiu suas atividades para diferentes partes do mundo, incluindo o Brasil, onde começou a investir em 2014.
Com um portfólio robusto de R$ 1,7 bilhão sob gestão no país, a GEF Capital Partners tem concentrado seus esforços em três grandes segmentos: energia e eficiência energética, alimentação e agricultura sustentável e soluções urbanas.
Entre as empresas que se destacam está a HCC Energia Solar, uma integradora e desenvolvedora de plantas solares no mercado de geração distribuída. Além disso, a UCB Baterias, com foco na fabricação de baterias de lítio, e a Automapower, especializada em software para o setor elétrico, também têm recebido investimentos e desempenhado um papel relevante no avanço da infraestrutura energética sustentável no Brasil.
Em uma entrevista exclusiva ao Canal Solar, Ricardo compartilha insights sobre o atual cenário do mercado de energia, perspectivas para o futuro e desafios e oportunidades, destacando a importância do armazenamento de energia, a retomada do setor de geração distribuída e o potencial do mercado livre de energia.
Além disso, ele aborda a necessidade de um ambiente regulatório estável e seguro para atrair investimentos e impulsionar a adoção de novas tecnologias, contribuindo assim para a redução dos custos da energia no país.
Canal Solar: Quais são as empresas com atuação no setor elétrico?
Ricardo: Atuamos em energia renovável, geração distribuída, armazenamento de energia, automação e digitalização do setor elétrico. Gostaria de destacar três empresas.
A HCC Energia Solar é uma integradora e desenvolvedora de plantas solares no mercado de geração distribuída de até 5 MW. Investimos nela há dois anos. A empresa tem crescido bem, apesar de enfrentarmos desafios com a entrada da 14.300/22 e com a alta dos juros. Já desenvolvemos cerca de 35 MW em fazendas solares e, no varejo, superamos os 200 MW.
A UCB Baterias, anteriormente conhecida como Unicoba, existe há 50 anos e investimos nela há 5 anos. Localizada em Manaus (AM), a unidade se concentra na fabricação de baterias de lítio, desde baterias para celular e notebook até baterias que chegam a 5 MWh, utilizadas em BESS (Battery Energy Storage System).
Nos últimos anos, a UCB tem atuado nos Sistemas Isolados na Amazônia, oferecendo soluções off-grid. Hoje, cerca de um milhão de pessoas não têm o à energia nessa região. Tanto o governo quanto as distribuidoras têm a obrigação de levar energia para essas áreas.
Começamos a oferecer soluções de painéis solares, inversores e baterias. É possível tanto atender uma casa quanto criar um minigrid para uma comunidade. Desde que investimos nessa empresa, foram instalados quase 40 mil sistemas. Hoje, mais de 180 mil pessoas tiveram o à energia graças à nossa solução. Estimamos uma redução de 80 mil toneladas de CO2 ao longo da vida desses sistemas.
A terceira empresa é a Automapower (antiga Automalógica), focada em software para o setor elétrico, gestão de usinas, linhas de transmissão e distribuição, sistemas de proteção e controle de subestações, digitalização de parques eólicos e solares, entre outros. Essa é uma empresa em crescimento. Hoje, cerca de 35 GW de potência de energia renovável utilizam as soluções da Automapower, quase 20% da capacidade instalada do Brasil.
Canal Solar: Falando em baterias, como você vê a possível participação da tecnologia no próximo Leilão de Reserva de Capacidade?
Ricardo: Para mim, isso é fundamental e a UCB tem muito interesse nessa agenda. Somos membros da Associação Brasileira de Soluções de Armazenamento de Energia (ABSAE) e já tivemos diversas reuniões com o Ministério de Minas e Energia e outros órgãos políticos. Mesmo que a participação do armazenamento seja de 10-15% no leilão, já traz mais flexibilidade e eficiência para gestão dos ativos, principalmente nos horários de ponta. Empresas como UCB, Moura, BYD e Canadian já têm interesse nesse tipo de produto no Brasil.
Canal Solar: Existem algumas objeções quanto ao uso do armazenamento de energia. A insegurança jurídica devido à falta de regulamentação não pode afastar os investidores?
Ricardo: Sim, esse seria um dos obstáculos, mas temos casos bem-sucedidos em outras partes do mundo, incluindo na América Latina, Estados Unidos, Europa e Ásia. Será uma grande mudança, pois hoje os ativos de energia no Brasil são remunerados por kWh e ariam a ser remunerados pela disponibilidade.
É crucial a contribuição das entidades para ajudar na regulamentação. Caso contrário, haverá uma insegurança jurídica muito grande e pode ser que ninguém se interesse.
Canal Solar: Então, o mais importante é a sinalização que o governo está dando em relação à tecnologia?
Ricardo: É o primeiro o. Uma pequena vitória, mas o processo ainda é longo. Sabemos que não é algo que se resolva em dois dias; é necessário ter um arcabouço regulatório bem estruturado.
Canal Solar: Mudando de assunto, o setor de geração distribuída sofreu um pouco em 2023. Superado o primeiro trimestre, como está o comportamento do mercado neste ano?
Ricardo: Já temos visto uma retomada. A queda da taxa de juros tem ajudado. O preço do solar caiu muito, principalmente pela abundância de painéis solares na Ásia. Com essa redução de preço, o faturamento das empresas também caiu, mesmo com um volume de vendas maior neste ano do que no ano ado.
O que ocorreu em 2022 foi uma anomalia do mercado. Então, 2023 foi um ano de ajuste; todas as empresas tiveram que se adaptar.
Observamos uma retomada nas vendas no primeiro trimestre deste ano; as pessoas estão recalculando e vendo que, mesmo com a nova regulamentação, o retorno ainda é viável.
Acredito que veremos no Brasil o mesmo que ocorreu em outros países. A regulamentação começará a exigir que o consumidor com energia solar tenha uma bateria para ajudar a controlar a rede. Do contrário, colocaria um ônus muito grande na distribuidora para fazer esse controle sem nenhum armazenamento.
Canal Solar: Com alguns integradores enfrentando dificuldades, o fundo vê alguma oportunidade de adquirir novas empresas?
Ricardo: A HCC tem observado oportunidades de alguns integradores ou empresas menores que sofreram com o desequilíbrio entre oferta e demanda, e estamos avaliando de forma oportunística. Mas, como já temos uma empresa neste segmento, acabamos não buscando adquirir concorrentes.
Canal Solar: No último leilão de transmissão, um fundo do BTG Pactual foi o grande vencedor. Vocês também avaliam entrar nesse mercado?
Ricardo: Nesse mercado temos algumas limitações de investimento. Se considerarmos o tamanho dos leilões, estamos falando de múltiplos bilhões para fazer esse investimento. Nosso tíquete normalmente fica entre R$ 100 e R$ 200 milhões por empresa.
O que fazemos é investir em empresas que prestam serviços para as transmissoras. Vários clientes da Automapower estiveram envolvidos nesse leilão. Não investimos diretamente em projetos, mas fornecemos soluções que apoiam esse setor. A Automapower está plenamente engajada em apoiar as empresas que venceram neste leilão.
Canal Solar: Como vocês têm visto as oportunidades do Mercado Livre de Energia?
Ricardo: Temos estudado bastante a abertura do mercado livre. Acredito que será um ponto de inflexão entre geração distribuída e o próprio mercado livre, à medida que este se expande cada vez mais. Vejo isso como muito positivo para reduzir o custo da energia como um todo, mas é importante que todos os participantes sejam remunerados adequadamente. Se a abertura for total, poderá sobrecarregar a distribuidora e gerar problemas na prestação do serviço.
Assim, temos observado algumas empresas comercializadoras e outras que fornecem serviços relacionados à migração para o mercado livre. A própria Automapower é uma empresa que se beneficia disso, pois grande parte de sua expertise está na geração centralizada no mercado livre.
Canal Solar: Então, atuar diretamente na compra e venda de energia não é o foco?
Ricardo: Já consideramos no ado, mas enfrentamos alguns desafios que nos deixaram desconfortáveis. Ainda assim, avaliamos sempre que surge uma oportunidade, embora não seja o nosso foco principal.
Canal Solar: Última pergunta. Como você tem visto as propostas do governo para reduzir a tarifa de energia?
Ricardo: Não existe uma solução mágica para resolver o problema dos custos de energia. Acredito que o governo deveria seguir outro caminho. Ter um ambiente regulatório estável, com segurança, atrai cada vez mais investidores e novas tecnologias, permitindo a redução dos custos da energia.
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